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terça-feira, 19 de julho de 2011

O novo código florestal e a questão agrária

"A propriedade privada tornou-nos tão estúpidos e limitados que um objeto só é nosso quando o possuímos." (Karl Marx)



O novo Código Florestal aprovado pela Câmara dos Deputados vem sendo palco de calorosos debates, pois fica bem claro que este código não faz questão de preservar adequadamente o meio ambiente, mas de incentivar a ocupação de áreas verdes, estender as cercas dos latifundiários e tornar as terras deste país ainda mais concentradas.


É impossível não me recordar de um livro do Saramago – “Levantado do Chão – diante desta discussão, em que o autor disseca a estrutura política, social e econômica dos latifúndios portugueses. Um retrato nu de Portugal até meados do século XX, mas que é também um retrato do Brasil, onde a tríade religião, poder público e latifundiário compõem um esquema maléfico.

Nós, que moramos nas cidades, não temos a noção concreta do quão é a acirrada a disputa de terras no campo, principalmente em alguns locais do Nordeste, Centro-Oeste e Norte. Já ouvi relatos macabros de amigos e conhecidos, em que juízes são comprados por latifundiários, empreiteiras, e os que não se vendem são brutalmente assassinados; os assassinos, por sua vez, nunca são encontrados, a justiça nunca se move.

Ora, é evidente que são as pequenas e médias propriedades que mais preservam os mananciais e as áreas verdes, já que as grandes propriedades visam exclusivamente o comércio desenfreado. Além disso, a imensa produção destas escoa para o comércio exterior, o que mais abastece nossas prateleiras são as pequenas e médias propriedades, indubitavelmente. Com efeito, os grandes responsáveis pela aprovação do novo Código Florestal é a bancada ruralista que povoa o Senado e a Câmara.

A legislação anterior, diga-se de passagem, exigia uma faixa de 30 metros de vegetação em cada lado de um rio, agora, porém, exige apenas 10 metros. Se antes 30 metros não eram obedecidos, imagine meros 10, imagine como os rios tenderão a assorearem-se. A devastação dos biomas do Cerrado e da Amazônia deve aumentar consideravelmente, isso porque é muito comum, à noite, nestas regiões, os latifundiários ligarem máquinas possantes e adentrarem as matas, aproveitando a ausência de fiscalização, sem contar as queimadas criminosas. Um estudo recente demonstrou que o novo código permite o desmatamento de aproximadamente 700 mil km² de áreas verdes.

E qualquer um que tente combater esses crimes tornam-se inimigos mortais dos latifundiários e, por conseguinte, de seus representantes no Congresso. É uma luta árdua, sem fim. De um lado, a população rural, ONG’s e algumas poucas autoridades sérias. Do outro, todos os ruralistas, muitas autoridades vendidas e muito dinheiro. Chico Mendes e Dorothy Stang são os grandes mártires desta luta, a mídia deu bastante atenção a suas mortes e denunciou insistentemente os desvios, mas era questão de tempo vender-se. Há, entretanto, alguns veículos midiáticos sérios – os menos lidos –, porque a maioria está sob jugo da elite ruralista direta e indiretamente.

A Igreja Católica tem alguns militantes – e muitas vezes eles sofrem grandes represálias de seus superiores – que combatem a ganância dos agropecuários. Ora, a Conferência Nacional dos Bispos Brasileiros (CNBB) é uma pedra no sapato dos latifundiários, pois participa ferrenhamente da questão agrária e é comum apoiarem atos do MST. O Vaticano, por sua vez, presta constante atenção a esses movimentos sociais, o que gera, eventualmente, excomunhão de algum padre ou bispo devido à prática nada ortodoxa de seus subordinados, pois eles deveriam manter o status quo, e não combatê-lo.

A própria CNBB endossou essa declaração de José Cláudio no plenário: “Vivo da floresta, protejo ela de todo jeito, por isso vivo com a bala na cabeça a qualquer hora porque vou pra cima, eu denuncio. Quando vejo uma árvore em cima do caminhão indo pra serraria me dá uma dor. É como o cortejo fúnebre levando o ente mais querido que você tem, porque isso é vida pra mim que vivo na floresta e pra vocês também que vivem nos centros urbanos”. Nem precisa dizer que a bancada ruralista, bem como os mais reacionários da Igreja sobressaltaram-se, não é?

Segundo dados coletados pelo bispo Dom Tomás Balduíno, 2.709 famílias são expulsas de suas terras pelo poder privado por ano e 63 pessoas são assassinadas no campo brasileiro na luta por um pedaço de terra. Além disso, 13.815 famílias são despejadas pelo Poder Judiciário e pelo Poder Executivo por meio de suas polícias. E 422 pessoas são presas por lutar pela terra; 765 conflitos acontecem diretamente relacionados à luta pela terra; 92.290 famílias são envolvidas em conflitos por terra.

Esses números, caros leitores, refletem a situação crítica deste país. Mas, como escrevi no início do texto, nós, que moramos nas cidades, não fazemos idéia de tais números. O agronegócio, sem dúvidas, é uma fonte inestimável de empregos, impostos e riqueza, entretanto ele expande-se de forma descontrolada, atropela a sociedade, os pequenos e médios produtores, a vegetação e o bom senso.

E enquanto todo o Brasil não tomar nota do que acontece no campo, as cercas continuarão a avançar, as disparidades no campo tornar-se-ão mais gritantes, o Poder Público continuará a ser corrompido, inocentes morrerão, as famílias expulsas de suas propriedades rumarão às cidades aumentando os bolsões de pobrezas nas capitais... Tudo isso é, inexoravelmente, reflexo da caduca idéia de propriedade privada e do velho lema “TER é PODER”!

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